– Dona Maria, bolsinha por dez reais. Tem de todas as cores.

Minha mãe nem mexeu a cabeça.

– Dona Maria é a sua avó.

Papai não escutou o comentário dela, estava parado, um pouco à frente, examinando uma panela de pressão vermelha. Não sabia cozinhar nem ovo. Deve ter gostado da cor.

Duas horas depois, na última rua da feira, meu pai parou numa banca de eletrônicos.

– Ainda vai comprar mais porcarias, José Luciano?

A vendedora entendeu como uma ofensa.

– Porcarias, não. Respeite os meus produtos.

Preciso sair em defesa da minha mãe. Ela quis dizer: eletrônicos de pouca durabilidade que serão esquecidos no quarto de depósito. O insulto era destinado a meu pai e não aos produtos.

A cada seis meses viajávamos quatrocentos quilômetros para ele comprar rádio de pilha, caixa de som, lanterna colorida, barbeador digital.  Após dez anos com o mesmo roteiro de férias a paciência não era mais a mesma.

As bochechas dela ainda estavam vermelhas quando entramos no carro.

– Você só me faz passar vergonha, José Luciano.

– Eu? Você fala mal das coisas da mulher e eu levo a culpa?

Escutei quando ela empurrou os objetos que estavam no banco de trás. Alguns estralaram.  A tensão permaneceu por quase uma hora até papai falar entusiasmado.

– Pare! Olhe ali.  Tonho das Molas.

– Molas, José Luciano? Era só o que faltava.

– Eleonora, não são molas. São amortecedores.

– Pelo amor de Deus, já chega de tanta bugiganga.

– Ô mulher teimosa, os amortecedores do carro estão velhos. Não escutou o chiado sempre que passamos por um desnível?

Entrei no primeiro retorno. Duas crianças teimosas de cinquenta anos são piores que dez de cinco. Seriam expulsos de ônibus, táxi, Uber. Ele sorriu quando percebeu que eu voltava. Ela cruzou os braços e virou o rosto pra janela. Parei em frente à loja. Papai piscou pra mim e desceu.

– Eu vou também. Quero só ver o que tanto ele comprará.

Fui atrás. Não permitiria que a reputação da família fosse destruída por uma briga na loja de Tonho das Molas.

Se eu fosse chutar, diria que cem ocupavam todo o espaço. Vasos de Cerâmica. Largos, pequenos, compridos, coloridos.

– Oxe! E você vende vaso?

Papai não escondeu a surpresa.

– De todo tipo e da melhor qualidade da região.

– Mas na placa tem molas.

– Ah! São meus cachos. Olhe, igualzinho a uma mola.

Tonho esticou uma mexa do cabelo que subiu e desceu.

– Todo mundo aqui só me conhece por Tonho das Molas, se eu colocasse Tonho dos Vasos, ninguém saberia que era eu. Entendeu?

Mamãe soltou uma gargalhada, papai desconfiou e Tonho nos convenceu a levar três dos melhores vasos da região.